Assembleia Geral de Credores e o Reconhecimento do Voto Abusivo

Raquel de Amorim Ulrich
ADVOGADA NA GUERRERO PITREZ ADVOGADOS

Nos processos de recuperação judicial, a Assembleia Geral de Credores (AGC) é o espaço central para o debate e deliberação acerca do plano de soerguimento da empresa em crise. No entanto, não é incomum a ocorrência de votos contrários que se afastam de uma lógica econômica razoável, colocando em risco não apenas o sucesso da recuperação, mas também o interesse coletivo dos demais credores.

 É nesse contexto que se insere o reconhecimento do voto abusivo, uma ferramenta jurisprudencial cada vez mais consolidada. O Poder Judiciário, atento à preservação da função social da empresa e à efetividade do instituto da recuperação, tem se posicionado no sentido de buscar um ponto de equilíbrio entre o direito do credor e a função social da empresa.

 Nessa linha, ganha destaque o chamado cram down — previsto no art. 58, §1º da Lei 11.101/2005 —, que permite ao juiz homologar o plano de recuperação mesmo sem a sua aprovação formal pela AGC, desde que cumpridos os requisitos legais. Trata-se de um mecanismo de proteção contra condutas que, embora formalmente válidas, sejam incompatíveis com os objetivos do processo recuperacional, especialmente quando orientadas por interesses dissociados da preservação da empresa e da busca pela satisfação viável dos créditos.

Por isso, a disposição para o diálogo e a construção de alternativas viáveis é fundamental. O credor que se nega a compor e tem sua conduta reconhecida como abusiva pode acabar sendo desconsiderado no processo e, na prática, ficar à margem das oportunidades de negociação, inclusive no recebimento de seu crédito.

É importante lembrar que a falência nem sempre representa um caminho mais eficaz para o credor. Ao contrário, muitas vezes ela implica a dilapidação do ativo, longos trâmites processuais e baixíssimo índice de recuperação de créditos. A reestruturação, ainda que parcial e diluída no tempo, pode ser o meio mais inteligente de preservar valor — para todos os envolvidos.

 A superação da crise empresarial passa pela maturidade negocial e pela compreensão de que o sucesso da recuperação depende da atuação responsável de todos os sujeitos processuais.